POR FABRÍCIO COSTA RESENDE DE CAMPOS
O
Supremo Tribunal Federal, em modificação ao seu entendimento anterior, entendeu
que não haveria a perda imediata de mandato político em caso de condenação
penal. A mudança de paradigma se deu no bojo da ação penal relativa ao
parlamentar Ivo Cassol, condenado a 4 anos e 8 meses de prisão.
Em
2012, o STF firmou o entendimento de que a condenação penal transitada em
julgado implicaria na perda imediata do mandato político. A nova configuração
da casa (com a entrada dos Ministros Teori Zavascki e Luis Roberto Barroso)
culminou no entendimento pela maioria de que a Câmara dos Deputados ou Senado
Federal deverão, por votação secreta e maioria absoluta, decidir pela cassação.
Com
a nova definição do STF ao tema, a Câmara dos Deputados, em análise à cassação
do Deputado Federal Natan Donadon, manteve o mandato do político. A Câmara registrou apenas 233 votos pela cassação (24 a menos
do que o mínimo necessário), contra 131 pela absolvição e 41 abstenções. A
decisão foi duramente criticada pela população e meios da imprensa.
A
crítica sem base teórica não é suficiente. Para análise do acerto ou erro na
decisão do STF, transcrevemos os arts. 15 e 55 da Constituição da República de
1988:
Art. 15. É vedada a cassação
de direitos políticos, cuja perda ou
suspensão só se dará nos casos de:
(...)
Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:
III
- que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das
sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta
autorizada;
§
1º - É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no
regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso
Nacional ou a percepção de vantagens indevidas.
§ 2º - Nos casos dos incisos I, II e VI, a
perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado
Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva
Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada
ampla defesa.
§
3º - Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa
da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus
membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada
ampla defesa.
Interessante
notar que o art. 15 da CR/88 determina que haverá a perda ou a suspensão dos
direitos políticos em caso de “condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem
seus efeitos”. O art. 55 da CR/88, por sua
vez, estipula que perderá o mandato político o Deputado Federal ou o Senador “que perder ou tiver suspensos os direitos
políticos” (inciso IV), ou “que
sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado” (inciso VI). Apenas no caso do inciso VI, do art.
55 da CR/88 (condenação criminal transitada em julgado), há determinação
expressa para que a cassação se dê mediante voto secreto no plenário da casa
pela maioria absoluta. Quanto ao inciso IV, do art. 55 da CR/88, permanece
silente o procedimento a ser adotado, o que é interpretado como perda imediata
do mandato político.
Duas interpretações possíveis:
1ª) Entendimento anterior
do STF
condenação criminal transitada em julgado → perda ou suspensão dos
direitos políticos (situação prevista no inciso III, do art. 15 da CR/88) →
perda automática do mandato (situação prevista no inciso IV, do art. 55 da
CR/88)
2ª) Entendimento atual do
STF
condenação criminal transitada em julgado → perda ou suspensão dos
direitos políticos (situação prevista no inciso III, do art. 15 da CR/88) → desconsideração
da situação prevista no inciso IV, do art. 55 da CR/88 → cassação do mandato
pelo plenário por maioria absoluta em voto secreto (situação prevista no inciso
VI, do art. 55 da CR/88, com o procedimento previsto no §2º, art. 55 da CR/88)
Não nos parece válida a argumentação jurídica atual construída
pelo STF, em razão da sequência óbvia e intransponível de fatos jurídicos. O
entendimento atual do STF afronta o princípio lógico espelhado na Navalha de
Ockham:
"Se em tudo o mais forem idênticas as várias
explicações de um fenômeno, a mais simples é a melhor"
Para que se suponha válida a interpretação atual do tema levada a
efeito pelo STF, o Tribunal deve desconsiderar a perda ou suspensão dos
direitos políticos previamente, para que somente assim o político condenado
possa incorrer no inciso VI, do art. 55 da CR/88 e lhe ser aplicável o
procedimento do §2º do mesmo dispositivo legal. Ou seja, o STF, para manutenção
de sua atual interpretação torna sem efeito não apenas um dispositivo constitucional,
mas dois: o inciso III, do art. 15 c/c inciso IV, do art. 55 da CR/88.
Os eventos jurídico se seguem cronologicamente conforme
demonstrado na primeira hipótese interpretativa, culminando de forma
irredutível na perda automática do mandato pelo político condenado
criminalmente com trânsito em julgado da decisão.
Fabrício,
ResponderExcluirConcordo com sua colocação, realmente o entendimento manifestado pelo STF foi, s.m.j., equivocado, bem como fatídico o resultado da votação do congresso. Fatídico, mas não inesperado.
Acho preocupante o fato do brasileiro já não se assustar com situações absurdas e esdrúxulas como esta, em que um cidadão criminoso, com decisão transitada em julgado, não perde o seu mandato imediatamente.